sábado, 2 de outubro de 2010

Sozinha

          Sozinha. Sim, sozinha. Aqui quero fixar o meu eterno repouso. A cama aconchegante não me aconchega mais. Os lençós não estão mais quentes. O melhor esconderijo não me esconde mais. As palavras estão vazias. O amor já não existe mais. Então, achas que devo importar-me? Não, não devo. Porque me importaria? Apenas pelo fato de que saí de teu ventre, mulher?
          "Sangue do meu sangue". Oh, falas como se isto fosse algo bom. Ao contrário, o nojo me corrói por dentro como um jato de lava num ferro indefeso, apenas por saber que o que sai da tua boca suja é a mais pura verdade. Sim, saí de teu ventre. Mas, e daí? Você não passa de uma parasita. Uma parasita tentando sugar o último vintém de meu pai. Perdão? Achas que você merece o meu perdão? Não se preocupe tanto, pois não vai ter.
Cada gotícula de meu sangue ferve freneticamente rápido, apenas pelo toque de sua mão. Me causas tanta repulsa que chega à doer. Dinheiro? Para quê queres dinheiro hoje, mamãe? Para beber? Porque não para de beber? Porque não para de chegar todo dia em casa bêbada e querendo me espancar? Não vê que isto só me machuca? Não vê que estou sofrendo? Não vê que a dor de que falo não é dos espancamentos, mas sim da solidão? Sim, a solidão que me aprisionastes! Porque fez isto comigo, mamãe? Porque me abandonou? Eu era uma simples criança... Mas você! Oh, você fez questão de me destruir!
          Você sempre fala para eu estudar e ter um futuro decente. E, tudo isso para quê? Para você pendurar-se em mim e me sugar como sempre fez com o meu pai? Você não fará isto de novo comigo, mamãe. Não mais.
          E eu só quero que você saiba que cada minuto do meu tempo, cada trabalho de escola feito, cada noite sem dormir para estudar, é para que eu um dia saia deste inferno e lhe deixe sozinha, completamente abandonada. E aí, quando todos lhe abandonarem, você vai ver que eu... que eu fui a única que um dia lhe amou de verdade.
 

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